Eu, eleito?
Ainda não há nítida separação entre Estado e Igreja no nosso país
Em 1903, Russell publicou seu célebre ensaio ‘O Culto do Homem Livre’. Nele estão contidas as ideias do singular filósofo sobre a religião.
Uma das críticas de Russell foi dirigida à oposição religiosa ao progresso humanitário e científico. Não foi para menos, pois, muitos eram os que acreditavam que certas doenças tiveram origens nos pecados e que seus portadores deveriam sofrer por isso, somente pra ficar neste exemplo.
Mas neste pequeno ensaio não tenciono discutir as ideias, inseridas no citado ensaio, do pensador inglês, morto em 1970; mas, sim, o peso das convicções religiosas nos momentos cruciais da política.
Essa interferência, mais viva e intensa na Idade Média, perdura nos dias atuais de forma menos ‘invasiva’, mais discreta, através de dogmas, preconceitos e referências pecaminosas.
Na maior religião praticada no Brasil, as divergências políticas internas são consideráveis, especialmente entre teólogos da libertação e conservadores.
“Na maior religião praticada no Brasil, as divergências políticas internas são consideráveis, especialmente entre teólogos da libertação e conservadores”
Nas outras várias denominações religiosas há participação política direta de graduados membros, partidarizados em diversas siglas, influenciando, resguardados os diversos níveis de densidades eleitorais, na vida política nacional.
Esse interesse direto nas questões de governo por parte dos segmentos religiosos, não só nas da fé, está a demonstrar que a separação entre igreja e Estado ainda é um problema insolúvel em pleno século XXI.
Há uma militância religiosa a ser considerada a cada decisão governamental. A diferença é que, atualmente, não há uma supremacia considerável entre as várias denominações, tendo a Igreja Católica perdido espaço político, não influencia sozinha.
Russell considerava todas as religiões perniciosas e falsas, e, para deixar de sê-los, deveriam libertar-se desses elementos: suspeita, medo e ódio. Para ele, não é com orações e humildade que fazemos com que as coisas aconteçam do modo como a gente quer, mas com o conhecimento das leis naturais. Um racionalista, penso.
Ao ler nos jornais ministros de Estado respondendo a demandas por opções pessoais de gênero e participação em movimentos sociais, percebe-se que os dogmas e conceitos religiosos ainda fomentam debates e decisões governamentais.
A religiosidade é viva no dia a dia das pessoas em plena contemporaneidade. Ainda não há, também, nítida separação entre Estado e Igreja no nosso país.
A política se torna fundamentalista e pouco democrática quando o terreno público é ditado por conceitos e dogmas religiosos. A suspeita, o medo e o ódio, como profetizava ‘Lord’ Russell, estão mais que presente num espaço/tempo que se diz civilizatório.
A humanidade pede passagem. E logo pra quem? Menos, bem menos, para os errantes e pecadores...
É por aí...
GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é formado em Filosofia e Direito pela UFMT.