17 de abril de 2019

Novo gestor do MEC colecionou elogios e polêmica em curta carreira acadêmica

SÃO PAULO - Ao tomar posse, na última terça-feira, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, tentou acalmar os ânimos de analistas que se disseram preocupados com a falta de experiência do economista paulistano na área educacional. Ressaltou aos presentes ser professor universitário, como “70% dos ex-ministros” dos últimos 16 anos, e em uma instituição “bem renomada”, a Unifesp.

Sua experiência acadêmica, porém, é tão curta quanto polêmica. O nome escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro para estancar quase cem dias de paralisia da pasta passou pouco mais de quatro anos dando aulas de microeconomia e mercado financeiro na Universidade Federal de São Paulo, onde pouco tratou de temas relativos à área de Educação, segundo seus alunos.

Sua performance como professor nos cursos de Ciências Atuárias e Ciências Contábeis no campus de Osasco é elogiada mesmo por estudantes que não concordam com suas posições políticas. Já nas relações com colegas e alunos, colecionou desentendimentos e foi alvo de apurações da instituição por responder a ataques de estudantes nas redes sociais.

O GLOBO procurou o novo ministro, mas ele não quis falar com a reportagem. A Unifesp disse ser uma instituição acadêmica apartidária, com espaço de discussão ampla e irrestrita acerca de quaisquer temas que repudia toda e qualquer forma de violência contra quaisquer integrantes de sua comunidade.

Abraham, 47 anos, entrou na Unifesp em 2014, quando foi candidato único a dar aula de Aspectos Práticos de Operações de Mercado. No concurso, tirou a nota mínima: 7. Entre os oito professores aprovados para dar aula no campus de Osasco naquele ano, foi o que ingressou com a nota mais baixa. Ao passar no concurso, o futuro ministro se somou à sua mulher, Daniela, e ao irmão, Arthur, que já davam aula no mesmo campus.

Por meio de um e-mail anônimo, o trio foi acusado de nepotismo. Em uma reunião do conselho do departamento de Ciências Atuárias em março do ano passado, o irmão de Abraham se queixou da direção da universidade, que não teria levado o caso para a Polícia Federal. Os irmãos Weintraub acreditavam que a acusação tinha motivação política. À época, Arthur era colaborador da então presidenciável Marina Silva, da Rede.

Em 2015, Abraham ingressou com ação contra um aluno da Unifesp por causa de uma mensagem enviada a um grupo de membros da universidade. Em uma discussão sobre a mudança no sistema administrativo do campus, Mateus de Melo Sampaio, do curso de Administração, escreveu que o grupo não tinha “interesse em briguinhas de casal”.

No processo, o professor afirmou ter entendido “que tal alegação tinha conotação preconceituosa ao atribuir pejorativamente a ele condição de ser homossexual” e pediu indenização de R$ 31,5 mil. A juíza Debora Menezes julgou a ação improcedente por entender que a “questão repercutiu como mera brincadeira entre os alunos, sem aptidão para ofender a honra”.

Outra desavença, com professores, se deu durante discussões sobre a reforma da Previdência, em 2017.

— A reitoria fez um debate e publicou diferentes posições sobre a reforma da Previdência. O atual ministro enviou um e-mail nodesqualificando, como se fôssemos um bando de doutrinadores — diz Daniel Feldman, presidente da Associação dos Docentes da Unifesp (Adunifesp).

O clima na universidade ficou mais tenso em novembro de 2017, quando o então candidato Bolsonaro publicou nas redes sociais um texto assinado pelos Weintraub em defesa da autonomia do Banco Central. Tornava-se pública a colaboração iniciada em abril daquele ano. A aproximação se deu por meio do atual ministro da Casa Civil, deputado Onyx Lorenzoni (DEMRS), que se encantou pela dupla após seminário sobre Previdência no Congresso Nacional.

Dois dos cinco centros acadêmicos (Economia e Relações Internacionais) do campus divulgaram uma nota criticando o apoio dos Weintraub a Bolsonaro. Os irmãos reagiram com mensagem considerada pelos jovens agressiva e irônica. No texto, eles dizem que o CA de Economia deveria “deixar de ser ridículo” e os alunos do curso “deveriam ter vergonha de puxarem a nota média do campus para baixo”.

OFENSAS NO FACEBOOK

Em uma reunião do departamento de Ciências Atuárias em março de 2018, Arthur relatou que ele e o irmão foram alvo de quatro processos administrativos na universidade por responderem a ofensas de alunos no Facebook. Ele também reclamou não ter obtido respaldo da direção do campus. O irmão do ministro contou que nas mensagens os estudantes falavam em “matar e arrebentar” os professores.

Apesar dos embates, as aulas de Abraham, que antes da academia trabalhou por 18 anos no Banco Votorantim, são elogiadas por exalunos.

— Eram bem dinâmicas, consistentes. As questões políticas apareciam de forma mais indireta — diz Ellen Silva, de 26 anos, aluna de Ciências Contábeis.

Atas de oito reuniões de comissões e departamentos do campus de Osasco em que Abraham esteve presente mostram que suas intervenções tratavam sempre de questões pontuais.

Em uma delas, ele perguntou qual seria a posição do departamento referente a uma greve de professores. Também reclamou do horário em que alunos faziam batucada no pátio. Depois que foi revelada a sua colaboração com Bolsonaro, Abraham não compareceu a mais nenhuma reunião.

GUILHERME CAETANO E SÉRGIO ROXO SÃO PAULO

O GLOBO - 14/04/19 - SOCIEDADE